Reza a lenda que no Rio de Janeiro se a pessoa chama a outra para “ir lá em casa”, o convite não passa de uma firula – ninguém passa o endereço, não marca uma data, não faz um convite pontual.
Não sei se é verdade ou lenda urbana. Frequentei e, fui muito bem recebida, as casas de amigos por lá. Convites reais e bem aproveitados.
Aqui em Brasília no tempo em que nossa turma era antropofágica e se alimentava de si mesma, vivíamos nas casas, apês, kits, uns dos outros. E fazíamos reuniões e festas privadas que valiam mais do qualquer outro ambiente que pudéssemos frequentar.
Poder desfrutar da intimidade e do espaço privado de alguém é um privilégio. Oportunidade única de aprendermos mais sobre a pessoa, de entendê-la, de estreitar laços. Saber suas preferências, saber até de sua personalidade e estilo.
No último sábado, por acaso, recebi um convite para um café na casa de Rita. Seria mais um compromisso em um dia cheio deles. Mas como recusá-lo?
Foram momentos de conversa mansa e muitos deleites – das plantinhas tantas até a decoração.
Conheci e fui apresentada às peças de uma artesã que trabalha com reuso de papel, de uma designer com belas obras em madeira, que já teve uma marcenaria e um trabalho de projeções nacional e internacional.
Conheci o espaço alquímico da massagista e esteta.
Conheci a perfumista da alfazema mais cheirosa que já passei nos pulsos. O cheiro ficou em mim por horas e agora mesmo se colocar o braço sob o nariz ainda vou encontrá-lo na memória afetiva.
As pétalas de rosas, as cascas de frutas e legumes, o sebo de carneiro as misturas caseiras e alternativas, pensadas para ouvir os ensinamentos da natureza e quem rechaça a química e os métodos de sua indústria.
As embalagens de vidro. As cores e texturas do vidro.
O resgate das receitas do avô. O seguimento ao saber fazer da mãe.
Tudo isso contido fisicamente nos cômodos, tudo isso contido afetiva e emocionalmente em Rita, a quem conheço há mais de uma década sem, no entanto, saber mais do que conseguíamos falar em nossos encontros rápidos pelos eventos culturais da cidade. Em nosso abraço apertado.
O pessoal do Pacotão lhe chama “Rita Belas Pernas”, os sambistas lhe chamam de madrinha.
A minha filha, a convite dela, aceitou chamá-la de Vovó Rita. Assim, passa a ser a neta do coração de quem tem dois filhos, família grande com gente de todas as idades e até um exemplarzinho de gente com apenas um ano. Mas sem netos para chamar de seus – ainda.
Rita acabou de sair no jornal porque é voluntária de um projeto que propõe além do protagonismo feminino, a construção de pontes. E ela explica suas razões: “A vida é troca. E acho que o mundo não devia ter muros, deveria ter amor".