O tempo é uma ilusão.
O tempo – grande curandeiro – pode ser ilusão. Mas só quando se torna grande curandeiro.
Antes, afobado. Apressado. Impaciente. É um desatador de nós. Deixa pontas soltas. Nas quais se tropeça sem saber a razão.
Só quando ele passa. Ou se passa por ele. Incólume. Seus efeitos contrários se dão a conhecer.
O tempo como mestre. Guru. Sábio silencioso.
Antes, piscina profunda na qual se mergulha apenas no passado. Dando braçadas para trás. Nunca indo adiante.
Os insights. Os sonhos. As revelações. Os entendimentos. As terapias. Nunca em tempo real. Sempre tendo tomado de nós “os melhores anos”.
Era muito jovem.
Naquela época não podia compreender.
Não dá para excluir tal coisa do contexto.
O que foi feito era o possível.
Não damos credibilidade ao agora. Porque é como se ele pudesse ser justificado por atitudes impensadas. Erros crassos. Apenas mais tarde. Será possível ter a visão panorâmica do que foi aquilo. E proclamar o autoperdão. Dar nome vários a uma atitude. Para anos mais tarde dizer que ela foi vã. Ou acertada.
Nesse sentido o tempo não devia existir. Aqui poderia ser tomado como ilusão.
O momento vivido ser injustificável. Para o bem. Ou para o mal. Culpa. Ou inocência. Mocinho. Ou bandido.
Existir. Apenas.
Pensei em saudade como algo pouco natural. Fluxo contrário. Choque entre maneiras de ver o tempo.
Pensei em saudade como o contrário do viver. Ser/estar no momento presente. A saudade como sentimento. Dor no coração. Algo de aparência física só vem quando algo ou alguém é evocado.
Esteja absolutamente no presente – e não vai estar faltando. Nada. Nem ninguém. E por isso, não sobrevirá dor. Apenas regozijo.
Mas o ser humano nunca está satisfeito. A pulsão do desejo. O conceito. Só permite que frua até a obtenção. O desejado uma vez possuído, perde. Seu valor. Seu apelo. E pula-se para o próximo. Daí, viria o sentimento de insatisfação. De incompletude. De dor pungente. Lancinante.
Mais abafado na carência e na falta. Do que na abundância. E plenitude. O algo querido já não faz sentido. Logo se quer mais. Ou outro.
E todo o sistema capitalista se baseia nisso. Para criar descartáveis. Necessidades. Obsolescências. Que seguimos. Buscamos. Em nossa cegueira. Em nossa incapacidade de viver o espaço tempo instante agora. Nele. Nem antes. Nem depois. Nada é reação. Tudo sempre ação. Contínua. Assim é que a morte não faria sofrer. A morte instante. Certeza única. E nunca a dor. A saudade. A morte como perda. Mas como encontro. Que houve. Naquele instante. E já não há. E se o instante não for contado. Como finito. O instante é sempre o que se vive.
Não me agrada mais dar superpoderes ao tempo.
Quero ser instante. Possível. E respeitar a trajetória. Agora transformada no momento presente. Tirando o peso dos erros. Dos enganos. Das esperas. A vida se autodestruindo. A cada instante. A vida recomeçando a cada instante.
A vida em tempo real. A vida sem desculpas. A vida sendo. No aqui e agora.
Sem antes. Nem depois. Nem bordas.
Só o miolo.
Do agora.
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