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"Sim, bora", acampar

Quando estou muito atenta. Consigo evitar.


Quando desavisada, recaio em algo que considero um erro/desvio/falha da minha personalidade.


Não gosto ou não sei planejar coisas. Acredito que o acaso vai me proteger enquanto eu ando distraída e vou acumulando pequenos tropeços como marcar dois compromissos no mesmo horário. Ou me atrasar para algum porque precisava de mais tempo para me preparar psicologicamente ou estou entre desistir e encarar.


Só me dei conta do que representava ter dito “sim, bora”, para um convite para ir à Chapada dos Veadeiros, quando percebi o choque que a notícia causou em amigas que me conhecem muito bem. Nenhuma quis acreditar. Fizeram piada. Questionaram o motivo. A razão. A companhia. “Vou com um migo”, respondo. Que agora entendiam meu silêncio dos últimos dias. E blá blá.


Mas eu tinha marcado com elas. A virado do ano. Mas também queria tanto fazer pequena viagem. E podia fazer as duas coisas. Ou nenhuma delas. Esconder-me um pouco. Quase como cheguei a fazer no Natal.


Chega a ser engraçado. Pensar em como um bando de mulher consegue tagarelar e criar fatos e boatos a partir de uma única frase em um grupo de Rede Social. Entre elas, uma acreditou, me parabenizou, festejou a iniciativa, me mandou levar filtro solar, repelente e ser feliz. A minha ida, ainda mais acampando, era sinal de muita mudança. E isso era ótimo. Ela achava.


Com tantos espanto e festejo fui perscrutar no meu histórico de vida o que eu tinha parecido com acampar. Não havia nada. A não ser uma dormida numa barraca. Em espaço interno. Reclamando. Amedrontada. Morrendo de frio. Tipo quando uma criança dorme numa barraca em vez de usar a cama, em pleno apartamento. E faz birra de madrugada.


Houve a viagem ao Xingu. Mas tivemos lá certo conforto que eu não esperava. Dormimos todos na grande casa indígena que servia como recepção para turistas. Tomamos banho de chuveiro. Usamos banheiro de alvenaria. Comemos o que era preparado em grandes panelas em um refeitório tipo cozinha industrial.


É claro que nos foi oferecido o beiju, o peixe moqueado e o tracajá. Mas em plena terra indígena, era possível manter muitos dos hábitos da cidade. Dos ‘brancos’. Prometi ao cacique que voltaria lá. Era uma forma de me acalentar. Dizer que teria uma segunda chance para vivenciar a experiência sem as arestas que me impusera daquela vez.


Pois bem tranquila digo “sim, bora” e acho que está tudo certo. Passo os próximos dias na Chapada. Aquele lugar intransponível e distante para mim. Agora, fácil. De receber meu sim. E peço uma barraca emprestada. E faço uma mala mental. Até compartilhar a notícia com as migas. E a ficha cair de verdade.


Minha filha diz: Mãe, não precisa ter medo. Só precisa ir.


Eu toda mexida por dentro. Doida pra pular fora. Visualizando o espaço onde moro. Minha casa. Minhas quatro paredes – como o que eu mais preciso. Agora e sempre. Por que penso diferente vez em quando, meu Deus do céu?


Agora estou me esforçando para não dar vazão a mais um erro/desvio/falha da minha personalidade – e desistir em cima da hora. Por absoluta falta de condições de lidar com o fato de que “sim, bora”, acampar.



Imagem de Waltteri Paulaharju por Pixabay


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