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O RECONHECIMENTO

Uma vida as separa. Talvez dê uma vida. A diferença de idade entre as duas. E uma vida as une. Uma identidade. Uma saga. Uma verdade. São mulheres. Em uma ponta, uma supõe. Na oposta, a outra tem certeza. Em uma ponta, uma brinca com o tempo. Ainda crê que ele não falha. Nem há de faltar. Na oposta, a outra tenta não pensar que a maior parte dele ficou para trás. Em uma ponta, uma sonha com o amor. Na oposta, a outra revê suas escolhas. Conclui que não precisava ter se fechado tanto. Ter se trancafiado com as chaves do medo. Por trás das grades da negação. Em uma ponta, uma cata encontros. São pedrinhas soltas. Queria montanha. Mas não encontra eco. Só intermitência. Na oposta, a outra daria tudo para voltar atrás. Ser mais maleável. Acolher quaisquer falsas esperanças. Amar como se não houvesse amanhã. Nem que fosse por um dia. Que mal poderia fazer? Por que se deu tanta importância? Numa ponta, uma fala sobre desaprendizados. Dá conselhos. Sabe a teoria. Mas é arrebata pela prática de uma relação inconclusa. Gangorra. Sobe com sua fé na vida. Volta ao chão sem alegria. Na oposta, a outra não brincou. Ignorou os parquinhos. Fez da vida campo minado. Apostou na proteção. Sem saber que ela bateria na sua porta anos depois, cobrando uma conta cuja moeda saíra de circulação. Impagável, portanto. Uma, sente-se nutrida pelo trabalho. Roga aos céus que a vida seja só isso mesmo. Festa. Trabalho. E pão. Qualquer outra missão se torna penosa. Faz com que desacredite na capacidade de gerenciar burocracias. Na oposta, a outra não vê tanta graça. Não festeja. A comida lhe cai mal. E o trabalho. Se pudesse, o largaria. Já fez muito isso de trabalhar. Agora, conta as horas. Apenas. Em uma ponta, uma é espelho. Na oposta, a outra é o reflexo. Se pudessem se encontrar sob uma mesma mirada. Veriam. Em uma ponta, uma de pele rija. Cabelos sem tintura. Corpo atraente. Na oposta, o futuro chegado e tendo feito morada. Já não reconhecia quem fora. Mas tinha que assumir como ela mesma aquela outra que prateara suas madeixas. Trocara a pele como faz a cobra. Transformou o corpo em repositório de doenças e lacunas. Próprias da idade. Felizmente ainda não capazes de fazê-la parar. Em uma ponta, uma tinha um passado. Ainda que curto. Se alimentava de seus nacos. Mas se regalava lambuzando os beiços com as sobras do futuro. Farta. Prenhe. De tudo o que estava por vir. Seguindo o roteiro escrito com cuidado e boas técnicas de expressão. Na oposta, a outra paralisava. Não queria virar o pescoço. O pra trás era muito longo. Podia afogá-la. Podia perdê-la. Podia perde-lo na busca de alcançá-lo. O futuro. Era ousadia. Descabida para alguém da sua idade. No fundo, acreditava. Os contos de fada perpassam os tempos. Quem sabe. O príncipe? Acordado de algum torpor, cem anos depois, desceria de um cavalo-carro. E contaria dos infortúnios. E ganharia o seu perdão. E começariam com a fome de anteontem. Porque o mais seguro era mesmo o passado. Uma e outra. Se postas frente a frente. Se reconheceriam. Como a mesma. Uma. Única. Feita de uma matéria chamada feminino.





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