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ROSA

Rosa abriu a porta para mim.

Tomava conta da casa e de mais três crianças. Uma delas, minha filha.

Rosa me sorriu um sorriso largo. Não protocolar. Espontâneo. Feliz.

Eu gostei de Rosa. Na mesma hora. Ela despertou em mim um lugar conhecido. Talvez pelo tom da sua pele. Talvez pela fartura de suas carnes. De seus peitos. Mãe preta. Daquelas que ofereceriam um colo.

Foi de lá, do colo de Rosa, que disse “sim” aos pasteis fritos na hora que me oferecia. Embora não devesse comê-los. Era Rosa quem os ofertava.

Entrei na casa. Apresentei-me e dei dois beijinhos. Foi então que soube seu nome.

Rosa tinha uma jovialidade que me confundia. Tanto podia ter 60 anos. Ou mais. Quanto vinte e poucos. E o que sobrasse podia ser reputado à vida, de mais sortilégios do que sortes, empreendida por Rosa, uma vez estando nesse mundo.

As meninas pediam mais pasteis. Mais bolinhos. Entre uma vassoura que tinha que ser encostada no canto para que pudesse lhes fazer os gostos e o continuar com a lida do trabalho, Rosa exalava paciência. Chegava a ser sabedoria. Daquela que corre nas veias do seu povo. Não reclamava. Não dizia nada sobre incompatibilidades entre cuidar de crianças e cuidar das coisas. A patroa estava era logo ali. Chegaria pouco depois das 19h.

De onde estava, pois Rosa parecia onipresente, apesar que pouco se fizesse perceber tão discreta era, eu a escutava tossir.

E como gostasse de dizer seu nome, eu perguntei: E essa tosse, Rosa?

- Ai, não sei. Uma patroa disse que acha que é alérgica. E contou alguma saga na busca por serviços públicos de saúde.

Eu, íntima de toda sorte de tosse, acometida desde criança por doenças respiratórias como sinusite, pneumonia, bronco isso e aquilo, fiquei intrigada com aquele som. Gutural. Visceral. Nem seco. Nem cheio. Não compreendi a tosse de Rosa. E foi pior para mim. Pois ela se repetiu, a tosse, à exaustão.

Saímos da casa na mesma hora. Rosa aceitara uma carona. Em todo o percurso, um tanto longo, e mais nos engarrafamentos que pegamos até que eu pudesse deixá-la em um ponto de ônibus que a fizesse chegar até a rodoviária, Rosa tossia. Fazia frio. Abri mais os vidros. Tentei fechar os ouvidos. A viagem não acabava. Porque não acabava a tosse de Rosa.

Pensei nela nos próximos dias. Perguntou-me se eu teria alguém para indicar os seus serviços. Havia espaço em sua agenda. Pensei nela nos próximos dias também porque sonhei em ser a pessoa que contrataria Rosa às terças-feiras.

Foi então que recebi o telefonema.

- Sabe Rosa? Ela morreu. No meio da rua. Infarto fulminante.

Continuei pensando nela.

- E essa tosse, Rosa?


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