Entrevistei uma odontopediatra por esses dias.
Além das dicas usuais sobre a idade indicada para levar uma criança a esse tipo de profissional, sobre os tipos de pasta e escova ideais, a importância do uso do fio dental e cuidados adequados aos dentes de leite e aos permanentes, um alerta para algo que via, mas ainda não enxergava.
A relação entre o tipo de alimento consumido e a qualidade da estrutura dentária para além dos produtos cariogênicos (com alto teor de açúcar) e suas consequências, chegando à estrutura óssea.
Lembrando de uma analogia entre os principais hábitos alimentares dos brasileiros e sua forma de falar contida num texto que eu soube existir pela narrativa de uma amiga gaúcha de fala visceral, cheguei eu mesma a uma nova conclusão.
O texto, segundo ela, defendia que por comer carne – morder, rasgar, usar da força – os sulistas teriam uma fala gutural, forte. Já os nordestinos com sua farinha e rapadura (ou não sei ao certo o exemplo aludido a eles), falariam mole, suave. E assim por diante.
Não conheço o texto. Nem posso atestar a sua autoria ou detalhar seu conteúdo.
A história me foi relatada há anos. Na época fez sentido. E seu teor inusitado não me deixou esquecê-lo. Embora não tenha buscado o original até hoje.
A partir dele, que nunca me saiu da cabeça, fiz essa analogia. Se bem que é possível que o seu conteúdo não seja apenas um devaneio e já esteja sendo alvo de estudos.
Os bebês e crianças com sua comida pastosa (para além do necessário) e uma dieta de farta exposição às telas não falam mais.
Será?
Observemos os que estiverem por perto.
Tenho visto muitos pequenos que sequer balbuciam. Outros, em idade de falar algo, apenas urram e gritam (em decibéis exagerados para ouvidos que não carreguem amor e obrigações paternais e maternais). Como meninos lobos, crescem como Moglis que não exerceram seu direito à linguagem por estarem distantes daquela destinada aos humanos.
Vítimas de um descuido perigoso.
Uma palavra muito ligada ao universo infantil é “estímulo”.
Sem ele, muitos potenciais serão subaproveitados. Ou perdidos para todo o sempre. Um período de tempo tão curto e tão importante – a primeira infância – é um catalisador de um tudo ou nada.
Nossos filhos estão sendo largados em florestas de concreto. Obrigados a conviver com bichos de cérebro eletrônico. Alijados da interação com o mundo humano. Com o modo humano.
Desaprendendo a falar. Desaprendendo a conviver. Abarrotando consultórios de médicos, dentistas e otorrinolaringologistas porque estamos fechando suas bocas com chupeta, mamadeira e a exposição exagerada e precoce a meios de comunicação que devem estar vindo com algum tipo de droga virtual em face da dependência que têm causado.
Deixados a sós com signos tão diferentes, logo não terão como (nem por que) se comunicar.
Seguirão urrando pela vida.
Murmúrios de uma incapacidade imposta.
Sem condições próprias de se decifrar ou de ser decifrados, serão apenas devorados.