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SEMENTE POR DENTRO

As estações do ano nunca me disseram muita coisa.

Ou não quis ouvi-las.

O que considero um erro histórico.

Pensando bem, lá no Alto do Bodocongó, no nosso “terreno”, elas desfilavam uma a uma como prometido.

Vinha o sol, o veraneio. As chuvas. De verão. Vinham as mangas. Cajus. Seriguelas.

Vinha a seca. Terra em pó. Vinha o dia de São José. E o milho brotando. A garoa anunciando o mês dos santos. Pouco depois, o floreio dos galhos até ali opacos. E o recomeço dos ciclos.

Nisso reparei. Mas não sabia que se tratava da linguagem das estações.

Aprendi na escola que elas não existiam por aqui. Não falavam com os brasileiros.

Usávamos seus nomes pelo prazer de imitar o que vinha de fora.

Hoje a natureza fala comigo. Fizemos as pazes.

Esquecemos os dedos que um dia cruzamos num pueril ‘cortaqui’.

Onde moro as estações deixaram de ser ‘seca’ e ‘chuva’.

Para seguir o tradicional quarteto primavera-verão-outono-inverno.

Acompanho uma a uma. Da janela. Na benevolência do dialogar com uma paineira.

Acompanho uma a uma. Nas marcas que deixam no meu corpo. Corpo a corpo.

Nudez.

Abraço. Oferecimento que acolho de mãos juntas. Em concha. Em reverência.

Espiando atenta.

Ouvindo sons. Folhas secas.

Vendo cores. Grama verde.

Sentindo frio. Ar gelado.

Pulando obstáculos. Pé na lama.

Mas hoje é dia de brotar.

De abandonar o acalanto de ser semente.

Para rasgar a casca e deixar irromper novidade.

Renascimento.

De quem esteve escondida.

Se guardando para quando o carnaval chegar.

Colorida. Festiva. Balouçante.

Fechosa como drag queen.

Avisando com presença ‘estou aqui’.

Hoje é primavera.

E como agosto tem gosto de desgosto setembro tem sabor primoroso do novo.

E essas coisas não ditas feitas para ser sentidas têm efeito. De fato.

É estreia.

E por mais que o tempo não seja assim tão certinho. Eu sei. Verei flores no caminho.

Vejo flores em você.

Vi a flor de romã endurecer suas pétalas. Estrela. Fechar-se para ser fruto. Trazer bons augúrios.

Vi tantas flores que não conhecia. Nem via.

E não era primavera. Ainda.

Vi todas as mangueiras exibindo seus bichinhos de estimação.

E era. E sempre será. Primavera.

Tempo de brotar.

Para rasgar a casca e deixar irromper novidade.

Quero cavucar terra fogo água ar.

Vejo flores em você.

Me diz o espelho d’água.

Imaginar um mergulho num mar de rosas.

Oferecê-las.

Sentir o perfume que fica sempre.

Nas mãos que as oferecem.

Todo semana vejo o buquê chegar.

Nunca é no meu andar.

Dedo verde.

Minha mãe.

Plantando flores.

Sem prescindir das rosas. Em datas comemorativas.

Sem deixar de enfeitar os túmulos.

As flores são da vida.

O brotar é para quem tem.

Semente.

Dentro.

De si.

Da gente.


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