Eu fazia uma entrevista.
Em meio à conversa, uma olhadela no celular.
E a notícia, que ainda desconhecia: Luiz Melodia morreu.
“Quedei triste”, continuava o remetente.
Mas só podia.
Respondi com uma ligação e ouvi ao fundo.
As melodias de Luiz.
A perda de um artista tem um mérito.
Sua obra continua disponível para nosso desfrute.
Até dá para fingir que não houve a passagem, a transmutação.
Tirar a tristeza do coração e seguir reverenciando, curtindo, sorvendo.
Não que seja fácil.
Senti pelos poetas e pela poesia.
Tanta gente indo.
O povo de quem gosta.
Belchior. Luiz.
Ajuda cantá-los.
Ouvi-los alto.
Refletir a partir de suas pérolas.
Negras.
Ou não.
Com outro interlocutor, no trabalho, ousei dizer que Melodia era o Elza Soares.
(Aliás, os dois juntos, quanta grandeza)
O Ney Matogrosso dos pretos.
Pela interpretação criativa, intensa, bonita, atenta.
Para mim o cantar que preenche envolve mais do que afinação. Ou afetação.
É feito de nuances.
De variações poucas.
Um teatro delicado.
Para bebês.
Chorar sem soluços.
Sofrer sem pânico.
Enraivecer sem esbravejar.
Amar sem alarde.
Gozar sem gemer.
Tudo dito, no entanto.
Pelas cordas.
Vocais que nos levam pelo timbre coberto de pele negra.
Viagem boa de se fazer com olhos fechados.
Ouvidos abertos.
Corpo em movimento.
O resto (e o tudo) é sentir.
Paro. Calo. Por aqui.
Se a gente falasse menos.
Talvez compreendesse mais.