- Filha, não vou deitar com você. Para não adormecer. Ainda vou escrever para o blog.
- Você vai escrever sobre o quê?
- Não sei. Ainda vou pensar.
- Posso dar uma sugestão?
- Pode.
- Que tal você escrever sobre a segunda-feira?
- O que sobre a segunda-feira?
- Que na segunda-feira a gente acorda cedo. Que na segunda-feira a gente vai para a escola. Que na segunda-feira a gente vai trabalhar.
- Que acabou o descanso? Pergunto.
- É.
- Tá. Vou tentar.
Então, aqui numa segunda-feira cheia de frio falarei sobre ela mesma. Já com atraso. E já quase terça-feira.
E pensando como interpretar a dica.
A gente acorda cedo. Estuda. Trabalha.
Volta a fazer isso nos próximos quatro dias.
Mas a segunda-feira para ela pareceu o grande algoz.
Será que está contaminada pelo temor que os adultos sentem?
Não lembro de pregar contra a segunda-feira.
Mas exalto o sábado e o domingo.
Que peso teria para ela a segunda-feira?
Talvez coisa leve.
Adora ir à escola.
O ideal é que o despertador toque às seis.
Mas ando sem coragem de obedecer ao relógio.
Antecipo-me a ele.
Postergo o momento de acordá-la.
Ela reclama.
Precisa de um tempo maior.
Eu sei.
Mas argumento.
Está frio. Não estamos atrasadas. Se cumprirmos as missões chegaremos a tempo. Dormiu mais tarde. Precisava descansar.
É um círculo vicioso.
Porque com o tempo a menos para a preparação, o atraso e o estresse decorrente dele se tornam inevitáveis.
Pergunto-me a razão de não ter aprendido.
Aumentar o tempo do sono não funciona.
Não se repetirá.
Teremos paz nas primeiras horas da próxima manhã.
Promessa nunca cumprida.
Quando a vejo dormindo as forças todas vão embora.
Quando chamo uma vez: Acorda Maria Bonita.
E a voz não surte efeito.
Quando chamo a segunda.
Sigo para a próxima tarefa.
Minha.
E a harmonia – pelo menos interna – está perdida.
Isso costuma acontecer às segundas. Mas também terças, quartas, quintas, sextas-feiras.
Só os dias sem feira ficam livres.
Aí, sim, seria bom.
Mas ela acorda bem cedo – mais do que nos dias anteriores.
Sem despertador-relógio. Sem despertador-mãe.
E confesso sentir vontade de ficar na cama. Até mesmo de dormir. Mais. Até tarde.
Mas escuto passos leves. Porta sendo aberta. Voz baixa perguntando: te acordei?
Sim. Aconteceu. Acordou.
Dorme mais.
- Não consigo.
Eu também não.
Então, de pé.
As duas. Ver o céu. Sentir o clima. Saber o que tem para o café da manhã.
E depois que siga o dia.
Nome comum.
Palavra primitiva.
Versus palavra composta.
É tanta opção.
Ou nenhuma.
Tanta presença.
Ou solidão.
Afazeres.
Ou procrastinação.
Logo passam as horas.
E chega o dia em que ela poderia novamente me sugerir escrever sobre a segunda-feira.
A gente acorda. Vai para a escola. Vai trabalhar.
Vagabundo.
Vai te entregar.
Vai te estragar.
Vai te enforcar.
Vai caducar.
Vai trabalhar.