A frase saltou da conversa. Grudou em mim.
Achei que era a coisa mais pura, bonita e acertada que ouvira nos últimos tempos.
Sincera.
Verdadeira.
Só podia vir mesmo de alguém que já passara por quase todos os anos que a vida podia oferecer.
Um idoso.
Um sábio.
Um homem que, finalmente, amadurecera.
Não precisou da muleta do ‘para sempre’. Ou do ‘eternamente’.
Àquela altura sabia que o para sempre, sempre acaba. E a eternidade, estava prestes a conhecer. Se é que havia.
Limitou-se ao que podia ofertar. Sem promessas. Sem futuro. Sem grandiloquência.
E era tanto.
Significava uma vida sendo lembrada. Um resto de vida. A vida que restasse.
E era tanto.
Nunca se sabe o quanto.
Um homem velho sabe que não muito mais.
Tem orgulho de ter tido, estar tendo, a muito recomendada ‘vida longa’.
Para ela, a frase foi sentença.
De vida.
Deu ao seu esforço a certeza de que valera.
Era acertado enfrentar e enfrentar-se.
O homem velho. Sua rabugice. O medo que gostava de transmitir.
A distância que tinha conseguido impor às custas de seu tamanho.
Inibia. Sua voz. Afastava. Seus gestos. Afugentava.
Enfrentar-se no que encobria sua capacidade de lidar com aquilo.
Era humanidade pura.
Mesma matéria de que era feita.
Era velhice.
Mesma matéria de que poderia vir a ser feita.
O homem grande e velho era disso também.
Era isso.
Humano.
Menino. Miúdo. Apequenado pela sua condição.
Com boas lupas ou lentes, era possível enxergar. O gigante que fora desde que nasceu. E que ainda era.
Bastava enfrentar (se).
Sem saber, sabia que era isso.
Entrou no quarto.
Fez que não ouviu o desafio.
Não conseguiria.
Era mulher, ainda por cima.
Coisa de homem, aquilo.
Ela sabia que era coisa dela.
E ofertou sua disponibilidade.
E deixou claro seu desejo de tentar.
Usou cremes e loções.
Toalhas e água quentes.
O calor das próprias mãos.
Humano.
O gigante cedeu. Ainda confiava na intuição.
Inclinou a cabeça.
Baixou a guarda.
Fechou os olhos.
Nem precisou abri-los para saber.
Era mais. Muito mais. Melhor do que podia esperar.
“Enquanto eu tiver memória, vou me lembrar da senhora”.
Foi o que disse o menino.
Recém-barbeado.