Chegava à loja preparado para o burburinho.
As vendedoras pareciam abelhas em dia de coleta de mel. Barulhentas e eriçadas. Juntavam-se às outras para um cochicho nem tão discreto. Queriam desvendar o objetivo da compra do homem jovem e bonito.
Percebia o frisson e entrava no jogo. Aumentava o mistério com ares de indiferença. Sem explicação prévia, fazia a pergunta. Com seriedade e urgência. “Onde encontro unhas postiças para o pé?”
Aí, já era demais para as meninas. Unhas postiças, vá lá. Podia ser uma encomenda de uma mulher por quem tivesse afeto. A mãe. A namorada. A esposa.
O detalhe embaralhava mais o mistério.
A prateleira era apontada com um indicador direito ou esquerdo e ele se dirigia para lá deixando atrás de si possibilidades.
Precisava também de lixa, base, cola, tesoura. Levava tudo em uma nécessaire sóbria. Unissex.
Era manicuro conhecido em seu meio. Não tinha o ofício como atividade principal. Não ganhava dinheiro com aquela aptidão. Mas era um bom ‘apagador de incêndio’.
Quebradas as unhas de alguém em momento impróprio, podia resolver.
Foi assim no dia em que o amigo, no meio da caminhada, descobriu uma rachadura que podia levar à perda de boa parte da unha. Logo na mão direita. Sozinho, não pode evitar o grito de desespero. Era quase o pior que podia acontecer às vésperas do dia D.
Teria uma apresentação à noite e, em 72 horas, a formatura. As mãos deviam estar perfeitas. Disso dependia a performance. O espaço entre o sucesso e o fracasso.
Hora de ser racional. Pensar em uma solução. Não adiantava gritar. O berro teve seu valor. Era boa estratégia para se acalmar. Como respirar no saco. Ou contar até três.
Mas teria que ir além.
Lembrou-se a quem recorrer.
O “bombeiro” estava disponível para trabalhar no caso. Só não contava que a cola não cumprisse o efeito desejado. Não grudava. Tinha a textura adulterada.
Checou a data de validade. Vencida. Há meses. Recém-comprada. Sentiu-se enganado pelas vendedoras curiosas. Quis voltar no tempo e evitar a pressa que impediu a observação de detalhe tão importante.
Fez o que pode. E deu certo. A noite do amigo-cliente estava salva. Mas ainda restava o dia D.
No meio tempo, ele mesmo precisou de cuidados.
Tinha prática.
Sentou-se e avisou. Precisava fazer as unhas.
Um a um, tirava da bolsa salvadora, os utensílios necessários.
Paciente, cortou, colou, fez camadas em papel. Ajustou, lixou, pintou.
Estava quase tudo pronto.
Trabalho artesanal. Exigia paciência e apuro nos detalhes.
Subiu no palco.
Tinha mais um instrumento?
Não chegava a isso.
Era a palheta.
A unha do violonista.
As mãos deviam estar perfeitas. Disso dependia a performance. O espaço entre o sucesso e o fracasso.