Perguntar como será o dia hoje ou comentar sobre a temperatura, esteja alta ou baixa, é assunto oficial para qualquer relacionamento humano, seja com um desconhecido ou com alguém muito próximo.
Serve como pontapé para um bate papo daqueles de quebrar o gelo com quem quer que seja, do taxista ao pretendente. Do caixa do supermercado ao médico do plano de saúde.
É como a fé, na música de Gilberto Gil. Não costuma falhar.
Os cronistas têm como tema recorrente a falta de inspiração. Acho que todos eles já publicaram ao menos um texto sob o argumento de que não têm assunto.
Desfiando o vazio, terminam enchendo a página com obras clássicas e inesquecíveis, como ‘O exercício da crônica’, de Vinícius de Moraes.
Ou uma mais recente, de 2014, assinada por Luís Antônio Giron sob o título É hoje (Chegou o dia de postar uma crônica que não será lida por ninguém, exceto pelo autor).
E apesar de eu estar me prolongando ao divagar sobre o assunto, não é sobre ele que gostaria de falar. E nem sobre falta de inspiração.
Tenho tanto medo de escrever sobre isso, pela genialidade já mostrada em alguns textos da espécie, como falei acima, que nunca vou me deixar ser acometida por este mal.
Quando e se ele aparecer um dia, aí é que eu vou me virar e me desdobrar para tecer considerações a respeito de algo nomeado desde sempre e não esquecido propositalmente sobre a folha e a respeito do que se termina falando com a desculpa de que não há nada a ser dito.
O que eu pretendia originalmente abordar nesse texto é que, entre os assuntos recorrentes, o que eu mais vi dar pano para as mangas, nos últimos tempos, foi (e está sendo) o frio que anda fazendo em Brasília.
Eu não lembro de em anos anteriores ter tido o assunto ou a palavra tão na ponta da língua. Também não lembro de ter ouvido de terceiros tão numerosos relatos sobre as baixas temperaturas.
O foco varia. Fala-se do frio do animal de estimação, da quantidade insuficiente de casacos, da comida engordativa necessária para aquecer o corpo gelado, de garrafas de vinho, de beijo na boca, cobertor de orelha, solidão. Fala-se do vento forte. Fala-se de gelo e que tudo está gelado.
Há dias fecho todas as janelas e frestas e rezo para isso passar. E grito que estou sendo torturada. E não quero fazer mais nada a não ser torcer que o noticiário traga outras informações meteorológicas que não sejam sobre a permanência das baixas temperaturas pelos próximos dias.
Eu apenas espero.
E já não falo nada.