Por que mentimos? Enganar, iludir, trapacear: a ciência debate as causas da mentira, um hábito cada vez mais comum na era digital. Essa é a chamada de capa da revista National Geographic deste mês. Não comprei a revista. Não li o texto.
Mas o título me chamou a atenção sobretudo porque os meus olhos tinham acabado de correr pela manchete do Jornal de Brasília: Estelionato do amor no DF acaba atrás das grades.
As duas coisas se juntaram à lembrança do relato de uma amiga, há uns meses, em que dizia estar impressionada com a quantidade de mulheres que conhecia e que estavam vivendo simultaneamente uma mesma realidade: golpes.
Golpes nos quais os algozes eram seus companheiros.
Ela não conseguia entender como caiam, não enxergavam a esparrela na qual estavam metidas, aceitavam perder os frutos materiais de uma vida em nome de ganhar um naco de amor fajuto, abusivo e mentiroso.
Debatemos o assunto mas sem chegar a conclusões. Nos parecia que era mais um fardo desses que se carrega por questão de gênero.
O estar acompanhada a qualquer custo.
A falácia de estar vivendo os melhores capítulos dos contos de fada – aqueles do foram felizes para sempre.
A cegueira para uma realidade cruel que diminui, humilha, machuca e faz íntimo o inimigo. Livre para cometer crimes sobre suas camas, embaixo dos seus tetos, deitados nos seus colos.
Por que se submetem? Era a nossa pergunta amedrontada, pelo fato de estarmos no rol das vítimas em potencial. Pelo medo de também sermos acometidas pela cegueira um dia.
Não queríamos simplesmente julgar, mas fazer uma autocrítica, uma sessão de cura e descarrego.
No 'estelionato do amor' do jornal, o jogo de palavras até poético embutia a tragédia: Pelo menos onze mulheres, em quatro anos, foram enganadas por homens com os quais se relacionavam virtualmente e para os quais depositaram pequenas fortunas em contas fantasmas.
Eles diziam ter uma certa profissão e estar em outro país. Mas o seu labor era enganar o coração alheio, daqui do Brasil mesmo, embora fossem nigerianos.
Foram tão perspicazes que criaram um manual para quem quisesse entrar no ofício nada honroso. E seguiam encontrando adeptos. E presas fáceis.
Cresci ouvindo o ditado mais que popular: Quem mente rouba. E sempre senti muito medo das pessoas que usam da mentira como uma estratégia de vida, um jeito de ser. Elas fazem mais do que roubar.
Elas intimidam, geram insegurança e impedem que seja criado um laço de confiança nas relações, sejam quais forem.
Há um espaço social em que as mentiras e/ou omissões são, digamos, permitidas e bem-vindas (como fingir um motivo inexistente para faltar a um encontro ou para justificar um atraso).
Serviriam também para abafar possíveis abalos causados pela sinceridade, falta que até ganhou o nome bem sugestivo de sincericídio.
Deus que nos livre desses males. De todos eles.