Hoje é Dia de Fogueira.
Para Antônio, o casamenteiro.
O pobre santo vive levando castigo por dar de ombros às promessas feitas por seus devotos.
Ela, por exemplo, queria casar. Daquele jeito para sempre, como nos contos de fada. Que mal havia nisso?
Sonhava com a festa, com a igreja enfeitada, com o padre falador. Com a troca de alianças, com o beijo que selaria o compromisso. Com a festa de recepção, com a lua de mel, enfim.
Queria fazer como as noivas das novelas e atrasar um tanto só para entrar na igreja sob a expectativa aumentada de todos os convidados.
Soaria a Marcha Nupcial, seus olhos transbordariam (a maquiagem ficaria um pouco borrada mas no salão teriam dito que os produtos eram à prova d’água) e caminharia – passos resolutos e nervosos – em direção ao príncipe encantado, como nos contos de fada.
O que viria depois estava mais para comercial de margarina. Muito amor, casa bonita com jardim, filhos nascendo enquanto os próximos já estavam a caminho, problemas resolvidos, café na cama, beijo na boca, sexo quente.
Olhares enternecidos, parquinho com as crianças, mãos dadas.
Mas esse tempo nunca que chegava.
Era tão difícil assim encontrar a cara metade, a tampa da panela, o cobertor de orelhas, alguém para chamar de seu, um parceiro que aceitasse dormir de conchinha?
Era. Ela sabia disso.
Já havia perdido a conta dos agrados feitos ao Santo.
Adivinhações e simpatias não sabia quais faltavam ser testadas.
Até a graduação delas já tinha sido alterada.
Começou com as mais singelas. Se mandasse o marido, receberia flores e velas acesas.
O marido não vinha.
Foi crescendo a raiva e o desejo de vingança. Estava em luta com o santo.
Tiraria o Menino Jesus de seus braços. Devolução mediante a entrega de um amor certeiro.
O colocaria de cabeça para baixo. O penduraria em penhasco. Deixaria que dormisse embaixo de sua cama.
Santo ingrato. Mal-ouvido. Ajudar aquelas duas pobretonas lá, jogando pelo telhado o saquinho de moedas com as quais pagariam o dote e poderiam se casar, ele sabia.
Mas ajudar essa fiel tão antiga aqui, que há tantos anos se empenhava em agradá-lo, em renovar a fé, em caprichar nas orações, nada.
O jeito era confiar no correr do ano. Depois do 13 de junho o tempo passava devagar. Cada encontro poderia ser o desejado. Cada pessoa que conhecia tinha jeito de ser o amor reservado pelo destino.
Vivia de esperas.
De ilusão e crença. Euforia e cansaço.
Cansava essa devoção. Cansava essa credulidade. Cansava depender de um Santo que se mostrava tão pouco compreensivo e prestativo.
Exausta em mais um Dia dos Namorados que passava sozinha, uniu as mãos em prece, desceu o Santo da corda em que pendia, beijou sua testa de madeira, olhou para o alto e cantou.
Que seria de mim, meu Deus, sem a fé em Antônio?