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MASTIGAR REMINISCÊNCIAS

Hora do almoço. Decidi ir num sebo que oferece, além de livros usados a preços módicos, uns PFs. Dentre as opções de carne, de sustância, como se diz no Nordeste, escolhi uma costela com mandioca. Custava R$ 12,99. O prato. Enquanto esperava, quis me questionar sobre a escolha do lugar. Tão simples. Mas deixei a pergunta de lado. Eu gosto de comida bruta. Agradeço por minha mãe ter sido autenticamente nordestina, paraibana, nascida num sítio, na mesa de nossa casa. Sempre farta de mocotó, cozido, buchada, picado, bode, galinha, peru.


O garçom interrompeu minha espera silenciosa, para perguntar se eu queria “completo”. Costumo não misturar muitas opções de cardápio. Mesmo que coma tudo o que estiver sendo oferecido, faço por etapas, juntando o que mais combina. As coisas de caldo, gosto de saboreá-las ainda mais à parte, em uma cumbuca.


Então, perguntei ao moço, como se não soubesse da resposta: - Como assim? O que tem no completo e como seria o incompleto? Ele riu com jeito de quem não tinha muito compromisso com aquela resposta. E desfiou os tantos itens que constariam. Acrescentou que eu podia não querer qualquer um deles.


- Completo. Respondi. Mas se é por causa dessa misturada que estou aqui...


Não entendi o gosto do meu corpo hoje. Suas necessidades. Tão carentes de classe e ordem. Eu queria tudo ao mesmo tempo agora. E essa era a resposta para a razão de ter escolhido aquele PF. Não valia ir num self service. Teria que fazer escolhas. Tenderia a usar meu método de organização de prato. E, ao final, pelo que conheço de mim, terminaria achando que exagerei. Que fiz junções insuspeitas.


Não demorou, tinha diante de mim um prato comum, transparente, raso, quase transbordando. Havia uma carne na graxa, feijão, arroz branco, salada verde, salada de batata com maionese e ovo, repolho refogado e macarrão. Depois olhei no prato do lado e vi que lá tinha uma farofa que eu não tinha. Mas não reclamei. Só reivindiquei mesmo a mandioca alardeada. Nem um pedacinho destinado a mim. Aí, chamei o moço de novo. Dá para arranjar um pouco de mandioca? – Dá. Voltou com uma cumbuca lotada, cujo conteúdo quase não se equilibrava.


Tentei fazer as combinações assim mesmo. Primeiro, só as saladas.Depois, derramei uma graxa no feijão. Dispensei o arroz. A mandioca recém-chegada foi com a carne mesmo. O repolho foi indo. O macarrão reinou solitário. E foi ele a cereja do meu bolo. Digo, do meu almoço.


É que me lembrou o macarrão da casa de vó, cujo molho era manteiga (ou óleo) não sei, e colorau. E minha dúvida foi se me entregava à saudade e à nostalgia ou se vivia o momento. Mas percebi que o momento era indissociável das memórias de infância. E daquela casa, com a qual sonho com recorrência. O momento me dava o presente de me aproximar de um tempo tão distante e ao mesmo tão agorinha mesmo. Dentro do meu coração. De adulta. Indo almoçar num PF só para mastigar reminiscências.






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