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CHORO: REMÉDIO SEM CONTRAINDICAÇÃO

Reclamou do Choro. O estilo musical. Cria desse Brasil brasileiro. Cujo maior expoente é Pixinguinha. Disse que era chato. Repetitivo. Não se reinventava. Era o mesmo desde que se entendia por Choro. Não acompanhava as mudanças do tempo.


Retruquei. Achei a crítica apressada. Coisa de quem não se dava a chance de contemplar. Fechar os olhos e ouvir. Apelei para o que eu acho mais bonito. – E os improvisos nas rodas?


Evento comum em Brasília, cidade que pariu um clube e uma escola dedicados ao gênero, é impossível não esbarrar em uma roda de Choro. Na banca de revistas. Na padaria. Na esquina. Sob a janela de quem ensaia. Nos bares e casas noturnas. Na feijoada do sábado.


Quem pode resistir ao deslizar do protagonismo dos instrumentos e instrumentistas? Que se desafiam, como repentistas nordestinos. Brincam, como crianças em parquinho de areia. Olham-se, como enamorados cheios de afetos. Sorriem, como palhaços diante da plateia. Elogiam-se mutuamente, por meio de piscadelas, como mães apoiando seus rebentos de longe, em dia de jogo.


Conheço muitos chorões. Escuto suas falas sobre a teoria musical envolvida ali. Leio sobre o assunto. Mas pouco me serve o que é capaz de ser dito sobre. Diante de meus limites de não música, o bonito mesmo é ouvir. E dá mais orgulho ainda, quando consigo saber o nome das canções – adoro alguns. André de Sapato Novo. Espinha de Peixe. Assanhado. Cochichando. Murmurando. Também gosto quando as reconheço e acompanho os instrumentos com solfejos empolgados.


Alguns Choros com letras – que não chegam a ser unanimidade no ramo – fazem parte do rol das minhas favoritas, como Doce de Coco (Jacob do Bandolim e Hermínio Bello de Carvalho) e Lamento. Foi essa obsessão por letras de músicas o motivo de ignorar a música instrumental. Não me sentia apta a me dedicar a esse tipo de audição. Mas o Choro rompeu com essa a certeza inútil.


Foi Brasília, com sua fartura chorona, que me enfiou goela abaixo, em princípio, o filhote da nossa música popular. Foi a ‘Roda do Tartaruga’ que me mostrou das belezas que é acompanhar, por horas, a execução das canções. Todas as sextas-feiras era o mesmo compromisso. Além do encontro com as amigas e amigos, além da cerveja e dos bons papos, era sagrado observar dinâmica tão bonita.


O grupo começava pequeno. E crescia. Chegava gente de todo tipo – idades, estilos, cor de pele – instrumentos nas mãos. Cases amontoando-se ao redor das cadeiras. Um entrava, outro saía. Gente abria a roda e forjava mais um espaço. Os forasteiros levavam um tempo para ganhar o direito de participar. As mulheres, em menor número, foram puxando seus assentos.


Para quem ousa reclamar, eu indico. Uma Roda de Choro. Sorvida com cachaça. Dose diária. Ou semanal. Brasília oferece este remédio. E o melhor, não há contraindicação.





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