Rose amou. Engravidou. Esperou nove meses. Acariciou a barriga como se toca em corte de seda exposto em loja de tecido. Pariu. Com dor lágrima alegria. Ofereceu o bico dos peitos para ser prato de comida por uns tantos meses.
Rose cuidou do bebê, da criança, do adolescente. Como era possível para uma mulher simples, moradora da periferia, outros filhos para criar- com afinco cuidado amor. Rotina casa-trabalho entremeada por horas dentro de um transporte coletivo.
Rose estava feliz com seus esforços. Meninos na escola. Comida na mesa. Trabalho honesto e suado. Marido carinhoso vez em quando.
Adolescência chegou, Rose sentiu. Não com algum tipo de intuição. Mas com o nariz. Faro de mãe. Nesse dia, tremeu como vara verde diante da descoberta. O menino, afinal, se rendia às influências da turma, logo ele. Cortava os laços de proteção maternal. A inocência de ontem ainda, cedia lugar à curiosidade perversa. De provar. Aprovar. Poço sem fundo. Porta sem volta.
Junto com a fumaça iriam os esforços de Rose. Para não ser mais uma. Nem seu filho. Estatística fatídica e inevitável que desmaterializa o povo pobre. O menino ia entrar pela maconha, passar, talvez por outras drogas, até chegar e ficar e cair e morrer no crack.
Rose tremia como vara verde. Não iria fechar os olhos. Nem o nariz. Não perderia a promessa de Deus que era aquele rebento em sua vida. Não o perderia para o vício. Não o viria subjugado pelo tráfico. Não deixaria que um dia rompesse os laços familiares para sair por aí, doidivanas e maltrapilho. Sem dignidade. Sem vestígio de que era de família. Houvera sido. Até provar. Aprovar.
Ela sabia que um dia receberia a notícia. Ou nem isso. Talvez a sentença fosse de “desaparecido”. Ela sabia que um dia trombaria com seu corpo, o dele, no chão. Atingindo na porta de casa para que todos soubessem que não se brinca assim, que isso não se faz. Sem querer tatuaria o chão com sangue pisado. Deixaria o rastro. Antes da queda. Antes de se jogar. Antes de atirar-se ao chão. Nocauteando o vento. Gritando ódio raiva desamparo. Esforço de mãe deveria ser proibido de conhecer derrota.
Rose não ia fechar os olhos. O faro. Não era engano. Chamou. Clamou. O filho era dela. Não seria dos infortúnios. Nem da desgraça.
Perdia forças, mas nunca a esperança. Rose andarilha. Pegou o menino pela mão e o lançou em tantas casas bairros cidades quantos foram necessários para não criar vínculos. Não entrar em turmas. Não ser cooptado pelo chefe do pedaço. Sequer fazer amigos.
Meu filho. Você vai sair dessa. Você não precisa disso. Você não precisa. Você não. Você.
Fera leoa fêmea mãe Rose. O pior passou. Nem chegou a acontecer.
Hoje homem lindo. Pai de seu neto.
Rose ri. Ela conseguiu.