Penso em você. Bastante.
O bom dia que não digo, digo. E você não diz mais também. Mas eu ouço.
Não sei os seus motivos. Os meus é que está muito cedo. Depois, hora alta. Depois, já não se dá bom dia. Mas boa tarde. E um ‘boa tarde’ nunca trocamos. Penso.
E a tarde é a hora mais complexa. É toda grávida. Prenhe de tudo o que podia ser, mas raramente é. Porque quero dormir, mas não durmo. Quero ver filme e adormeço. É tempo que me leva a energia. E é justo o tempo que teria. Mas não tenho. Porque ainda estou no trabalho. Porque depois tenho que buscar minha filha. E outras crianças, às vezes. Porque tempo tempo tempo és um senhor tão bonito.
Depois já é noite. E fico toda atarefada. Entre o que devo fazer, o que precisava, o que não quero, o que deixo para amanhã. O que me dá mais trabalho justo por não ter sido concretizado e ficar apenas no plano do martelamento do juízo. Procrastinação. Ou coisa parecida.
Deito para dormir, mas não durmo. Seria exagero ou mentira dizer assim. Esse "não". Absoluto. Horas a fio, insone. Durmo e acordo de madrugada. E a madrugada me paralisa com braços invisíveis. Contraproducente acordar assim, de supetão. Atada.
Antes de conferir, faço minha oração. Ó pai, fazei com que agora já sejam seis horas da manhã. Pode ser até cinco. Já estaria bom. Mas isso não digo na reza. É segredo meu. Que também guardo boa relação com as cores que antecedem o pleno amanhecer. O amanhecido.
Sou assim ó – dedos indicadores roçando um no outro – com a transição dos turnos do céu.
Mas qual o quê. É meia noite. Duas. Três e cinquenta e três. Que dei para olhar para o relógio justo às 3h53. Não quero saber o que diz a Internet sobre isso. Recado dos anjos.
E eu saio arrastando a barra do robe – se houvesse um. Saio penumbra gelando os pés na cerâmica pouco receptiva. Vou à cozinha. Mas não acendo a luz. Lá na frente. E do outro lado. Há janelas. E não quero ser vista por vizinhos. Insones. Festeiros. Amantes. Adictos.
Eu só queria chegar no amanhã de forma mais convencional. E seja como for, o amanhã logo me consome. É tenra manhã e já não dou bom dia.
Porque esse negócio de dar bom dia pode parecer febre de redes sociais. E invasão de privacidade. E mais um tanto de não recomendações. Deixo para dali a pouco.
Já faz tanto tempo que não dizemos bom dia, que pareceria meio estranho. Sair-me assim, de repente, com essa. E vai que as palavras te pegam dando bom dia a outra pessoa. E ficam suspensas no ar. Sem receptividade. Desvalidas.
Eu gostava mesmo daquela época. E da linha silenciosa que nos liga. Porque liga. Isso não está no passado. É um bom dia como o mantra OM. Se arrastando. Fica inaudível. Mas fica. Vibra. Ondas infinitas. Som de cumprimento.
Porque te dou bom dia. Mesmo assim, sem dar.