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SÓ NÃO VIU QUEM NÃO QUIS

Às vezes penso que se minha adolescência tivesse sido em tempos de Facebook, inúmeras vezes eu teria sido dada por desaparecida.

Havia em mim uma certa rebeldia impossibilitando-me de “dar satisfação” aos pais. Um pedido de permissão, um telefonema básico, um recadinho deixado e não ficariam a minha procura.

Nunca fugi, nem tive motivos. A minha rebeldia não era do tipo sem causa. Era uma dificuldade, talvez de me comunicar, que ainda hoje trago.

Estava na casa das minhas amigas e na de amigas de minha irmã. Mas costumava me esquecer por lá, sem avisar nada em minha própria casa.

E aí, vinha o telefonema: Waleska está aí?

Com o tempo, a localização passou a ser obvia. E àquela buzinada lá fora, aparecíamos na porta e dávamos de cara com meu irmão, Raniere. Já sabia a minha rota. Ia me procurar.

Eu voltava com a cara deslavada. Não me desculpava e fazia ‘ouvido de mercador’ para o sermão de mamãe, que tinha um repertório afiado capaz de fazer perecer qualquer espírito mais forte. Menos o meu.

Hoje reflito sobre o quão desconfortável devia ser. Ao tomar como parâmetro apenas as redes sociais, a sensação é de que as pessoas estão desaparecendo mais.

Diariamente somos instados a compartilhar o pedido de informações por alguém que estava aqui agorinha. Os desfechos variam. De felizes a infelizes. De cômicos a trágicos. De enganos a falsas certezas. Há os casos sem desfecho.

Há tantos tipos de sumiço. Aqueles em que se sabe a resposta – negada historicamente, encoberta, institucionalizada como outra coisa. Aqueles em que a verdade nunca aportará. Aqueles voluntários – como tentativa de autorresgate. Aqueles involuntários – em que se é realmente vítima.

No livro de estreia da jornalista Paulliny Gualberto, Allegro ma non troppo, há alguém que evapora.

E de certo modo faz evaporar quem está por perto – fervido no caldeirão das dúvidas, das incertezas, dos questionamentos, da procura, das acusações mútuas, veladas ou explícitas.

Como leitores e já como membros da equipe de buscas, entramos em um cenário conhecido, pelo menos para quem é, mora ou conhece Brasília, o Distrito Federal e seu entorno.

A história é alocada por essas paragens. E, apesar do drama, a sensação de familiaridade com o lugar nos dá a esperança de que vamos encontrar um final feliz nas páginas.

Passeando por endereços conhecidos como as quadras, superquadras, a universidade, a Chapada, nos perguntamos que mal poderia haver neles a ponto de tragar alguém e nunca mais cuspir de volta?

Na vida real muitas vezes bradamos querer sumir – palavras ao vento. Esvaecemo-nos. Mesmo de corpo presente. Ou recebemos a invisibilidade como imposição. Até podemos nos extinguir seletivamente – para algo ou alguém.

Também é possível que, embora ausentes, estivéssemos lá o tempo todo.

Só não viu quem não quis.

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